Abandono
Paredes de restos de madeira, plástico e papelão, chão de terra batida, teto de zinco furado por onde feixes de sol invadiam a pobreza. Ela, olho inchado e nariz ainda sangrando, abriu a porta para a policial. Os vizinhos haviam chamado.
– Por que a senhora não denunciou ainda o seu marido? Seus vizinhos disseram que você apanha com frequência.
A mulher nada respondeu, parecia fraca demais para entabular uma conversação sobre um assunto tão dolorido.
– Nós mulheres não podemos mais admitir esse tipo de crime. Temos de ir à luta, denunciar, pedir justiça – continuou a policial.
Nisso, começaram a aparecer crianças, antes escondidas no fundo do barraco. Eram cinco ao todo, idades entre 2 e 7 anos, esqueléticas, maltrapilhas, famintas.
– São todos seus filhos?
– Três são meus, os dois menores são adotados.
Silêncio.
Emocionada e revoltada, a policial voltou a perguntar quase dramaticamente: – Por que não denuncia seu marido?
A mulher limpou o sangue do nariz na manga da blusa, respirou fundo e respondeu:
– Meu marido bebe muito, me bate, mas trabalha. Ele quem compra o pão, o leite, a maizena… Se eu tiver de trabalhar, com quem deixo meus filhos? Por aqui não tem creche, se eu sair pra trabalhar, vou presa por abandono de crianças…
Comentários