UTI

Estava internado  devido a forte pneumonia que provocou uma parada cardio-respiratória. Durante a morte, não viu túnel, nenhuma luz no fim, nenhum anjo o esperava, mas a habilidade dos médicos, o ressuscitou. Entretanto, foi induzido ao coma por dez dias para suportar as dores – entubação total.

As fortes infecções pulmonares provocavam o fenômeno chamado delirium. Para cada situação que ocorria na UTI, na mente ele criava uma fantasia relacionada. Como tentasse arrancar os tubos que lhe davam alimentação, ar e medicações, teve as mãos amarradas. Isso introduziu em seu filme inconsciente uma sequência de cenas de prisão e tortura. Além disso, defecava nas fraldas, mas em sua imaginação, era nas próprias calças. Por isso, onde quer que sentasse, deixava manchas fecais, e sofria sanções. Via-se voando dentro do hospital, mas chutou uma enfermeira de passagem.

Quando despertou, não dizia coisa com coisa, acreditava nas alucinações que criara. Fruto das dores da pneumonia, acusava os familiares que lhe faziam companhia de haverem esmurrado seu peito. Todos achavam que ele enlouquecera e não queriam contrariá-lo, concordavam com tudo que ele dizia, fato que aumentava nele a noção de estar certo.

Aos poucos, parecia melhorar das alucinações e o desamarraram com a promessa de que não retiraria os tubos. Então, ele arquitetou um plano de fuga. Esperou que o acompanhante dormisse no sofá ao lado e viu ali sua chance de escapar. Deixaria o hospital, tomaria um táxi que o levaria para casa… Entretanto, esqueceu-se de alguns pormenores importantes: estava praticamente nu, com aquela camisola breve que mal tapava a parte da frente, usava fraudas, não tinha dinheiro, estava entubado… Mesmo assim, resolveu colocar seu plano em ação. Ao tentar sair da cama, os tubos se esticaram dentro do corpo, dor aumentando, e quando pisou no chão, caiu. Depois de 13 dias deitado na cama, as pernas haviam perdido musculatura e já não suportavam seu peso.

O alarme soou, correria de enfermeiros e médicos. Por sorte conseguiram salvá-lo novamente.

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1 Comentário

  1. RUBENS RUSCHE
    29 jul 2016

    Este conto também poderia se chamar “Duro de morrer 5”. É tragicômico. Dei muitas risadas imaginando a situação descrita. Muito boa essa forma mais concisa e intimista que você imprimiu à escrita. Ela também está presente em “Comala” e “Pôr do sol”. Solidão, esperança e morte pinceladas com maestria. Bravo! Fico feliz em ver que sua escrita vai se adensando e se aprofundando cada vez mais. Beijo.

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