Vermes esverdeados

O sol do deserto matou esturricado um cachorro peludo. Dias depois, abutres revoavam ao redor, esperando que a carne apodrecesse ao ponto. De uma caravana que passava, um menino de dois anos foi abandonado nas areias quentes pelo pai que duvidava daquela paternidade. O pequeno olhou a redor, só areia, céu azul, luz implacável e abutres girando no alto. Sede e fome, decidiu procurar: um pouco andando, outro pouco engatinhando. Ao longe, as risadas doentias das hienas famintas. Deparou-se com os restos mortais do cachorro. Primeiro acariciou o animal, depois… A fome apertou e ele deu a primeira mordida numa pata, depois noutra… A fome era tanta que nem se incomodou com os vermes que se desprendiam da carne podre, continuou devorando os...

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Sonho Sufocante

Coisas ao redor me prendiam. Poderiam ser as cobertas… ou caixas de papelão? Pareciam ir fechando, apertando o pouco de céu, do espaço exterior, do ar livre. Ou seriam meus frágeis braços paralisados pelo medo de rasgar o tecido daquela realidade? Mas havia uma grande batalha interior. Eu queria sair dali, e querer é o primeiro passo – o Sol. E por isso, finalmente consegui despertar. Desenhei para mim uma manhã pastel, escorrida, sem atrativos. Andei pra lá e pra cá no gramado. O objetivo era escapar daquele sonho que permanecia quase no limiar do dia, que percorria pelos subterrâneos da mente como a Lua Nova, a impregnar meu corpo emocional, aquoso, de um desconforto órfão. Até agora não sei, ainda procuro entender a mensagem...

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ACEITO

 Certa noite, após um jantar em família, ouviu falarem por ele em sua presença, como se não mais existisse. Decidiam sobre assuntos cuja responsabilidade há pouco tempo lhe pertencia. Entendeu, então, que estava mesmo próximo do fim. Seu ego de nativo de Áries acostumado a andar na frente, a tomar decisões ousadas, a sempre buscar o novo, estava combalido. Mesmo assim, pensava em protestar, mas não por mais de alguns segundos pois sua mente logo encontrava compensações: não ser mais responsável por coisa alguma, não fazer nada ou fazer o que quiser, ou melhor, só fazer o que puder, como o Buda sentado embaixo daquela árvore… Já se encontrava no crepúsculo da vida, o tempo corroía os músculos, as carnes, os ossos já começavam a...

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ASILO

Certa noite, após um jantar em família, falavam por ele em sua presença, decidiam sobre assuntos cuja responsabilidade até então lhe pertencia. Entendeu que estava mesmo próximo do fim. O já combalido ego tentou protestar, mas não por mais de alguns segundos, pois ao contrário dele, o cérebro encontrava uma compensação: não ser mais responsável por nada, fazer o que quiser, não fazer nada, como o Buda sentado embaixo… Entretanto a coisa não era bem assim. Já se encontrava no crepúsculo da vida, o tempo corroía seus músculos, suas carnes. Colocar meias nos pés já era cansativo, correr nem pensar. Mas depois a ditadura sobre ele foi piorando: come isso, não come aquilo, olha o remédio, toma banho, faz exames, nada de frituras, obedece...

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